‘E PLURIBUS UNUM’





Vista da exposição ‘E PLURIBUS UNUM’, na Galeria Marília Razuk, São Paulo, Brasil



“E Pluribus Unum” é uma expressão latina que é o lema dos Estados Unidos da América (e também do maior clube de futebol em Portugal, o Benfica).
A expressão pode ser traduzida e interpretada de diversos modos sempre relacionados com a conexão entre o que é individual e o que é geral.
Podemos pensar em expressões como “um por todos e todos por um”, “um é muitos e muitos são um” ou “o individual é múltiplo e a multiplicidade é una”. Para usar uma expressão futebolística podemos evocar o mote do Liverpool: “You’ll never walk alone” (“Tu nunca caminharás sozinho”).

O objectivo da exposição é explorar o tema da unidade versus diversidade. A questão pode ser desenvolvida em torno da noção de identidade, seja a identidade individual, a identidade de grupo ou a identidade da própria espécie humana.

As obras de DOUGLAS GORDON, MIROSLAW BALKA e RUI CHAFES, pela diversidade (europeia?) das suas origens geográficas (Escócia, Polónia, Portugal) e culturais, e pela diversidade das técnicas, recursos e processos que utilizam, permitem exemplificar essa problemática, ao mesmo tempo que ilustram a enorme diversidade do território da arte contemporânea.

Os trabalhos seleccionados de DOUGLAS GORDON incidem sobre a questão da identidade individual (“Auto Retrato de Você e Eu”), mostrando como a definição de nossa identidade é sempre um jogo de projeção de nosso sobre o rosto do outro ou de (re-)construção do nosso rosto sob o olhar do outro. Sendo que nesse processo, alguém pode correr o risco de ficar cego, incapaz de se ver a si próprio ou de ver os outros.

Nesse jogo de imagens, nossos rostos se misturam com os rostos de atores, atrizes, estrelas e vedetas de cinema que, muitas vezes, melhor que as figuras reais, dão conta de nossos desejos, ideais e aspirações. Dos desencontros destes olhares sempre sobra um resto de mistérios e “paixões privadas” que não podem ser retratadas.

A escala humana (em muitos casos, as medidas do corpo humano, designadamente o corpo do próprio autor) é uma das referencias fundamentais da obra de MIROSLAW BALKA. Nesse sentido, embora seja difícil chamar sua escultura de figurativa, ela sempre implica uma figura humana. Ou melhor, duas figuras: uma figura de referencia, cuja pose ou movimento desenha a forma da peça; e a figura do observador, o corpo de cada um de nós que, no confronto com essa forma escultórica, re-define a consciência de sua própria medida. No entanto, a força maior da presença destas esculturas não resulta de um exercício de manipulação formal dos espaços dos corpos. Um espaço vazio de silencio (e drama?) onde se faz sentir o peso de memórias individuais e de memórias de uma história coletiva que, ela sim, foi a primeira a moldar nossos corpos. O que nós somos (também) é o que nossa história (nos) fez.

As esculturas de RUI CHAFES, produzidas propositadamente para esta exposição e para o espaço da Galeria Marilia Razuk, têm, também elas, uma ascendencia orgânica que poderia ser remetida (como é mais evidente em muitas outras séries de trabalhos do autor) para as circunstancias da fisiologia humana. Julgamos no entanto ser mais apropriado evocar aqui uma espécie de matriz orgânica estrutural, inerente a todas as formas vivas (e talvez também mortas) que nos instala num tempo que é, para além do tempo individual e do tempo histórico, um tempo metafísico em que a natureza, a humanidade e a morte são indissociáveis.
Esse é um tempo inacessível e, no entanto, a obra de RUI CHAFES pertence a esse tempo e obedece, portanto, a uma paradoxo. É uma espécie de testemunho ou despojo de tudo o que não pode ser, que é quase tudo.

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Texto produzido por ocasião da exposição “E PLURIBUS UNUM”, na Galeria Marília Razuk, São Paulo (13/05 – 15/07/2015)


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