Gerardo Burmester
Galeria Pedro Oliveira, 1992
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Arquipélagos Vermelhos, 1992. Vista da Instalação. |
Aproveitando da melhor maneira, como se vem tomando hábito, as suas excelentes
condições de espaço, a Gal. Pedro Oliveira acolhe a exposição de novos
trabalhos de Gerardo Burmester «encenados» especialmente para o local. Destaque
para a instalação Arquipélago Vermelho que, ocupando quase integralmente o chão
da sala grande, combina terra, placas de latão vermelho, um conjunto de peças
forradas a cetim vermelho e duas pontes em madeira, uma delas colocada no meio
da instalação e a outra contra uma parede. Completam a exposição 10 pequenas
esculturas de parede e uma peça de chão, Mãe, composta por um rolo de feltro
branco colocado dentro de uma caixa de madeira aberta em cima e gradeada à
volta. As peças de parede combinam a madeira com o feltro sobre o qual são
marcadas linhas.
Em termos gerais, esta exposição confirma e apura os aspectos mais
característicos do trabalho que Burmester vem realizando ao longo dos últimos
anos. Um jogo de contrastes, rigoroso e sensual, desdobrado aos vários níveis
de concepção e execução das peças, jogo de materiais, desde logo, privilegiando
o contraste de texturas calorosas: madeira, couro, feltro, jogo de cores,
sobriamente calculado, mas reforçando o envolvimento caloroso: vermelhos,
castanhos, negro; terra, sangue. Jogo de formas com uma geométrica austeridade
a enquadrar e a conter elementos que querem fugir para uma dimensão orgânica,
erótica, sentimental. Duplicidade dos sentidos e dos sentimentos. Entre a
neutralidade de processos de construção que poderiam remeter para formas de
produção industriais – mobílias, estofos – e uma vibração emocional que a
sensualidade da atmosfera do conjunto impõe, e o jogo dos títulos reforça, com
algum irónico distanciamento.
Duplicidade e distanciamento poderiam ser vistos como manifestações de
pudor do autor relativamente a uma vivência apaixonada – que simultaneamente
convoca e despista – da sua condição de artista e da condição dos objectos que
assina.
É no sentido de uma maior abertura e de uma maior teatralidade que aponta a
instalação Arquipélago Vermelho. Que, nessa medida, regista ecos de momentos
mais barrocos ou mais truculentos da carreira do autor. O alargamento do âmbito
de apresentação das peças, da escultura à instalação, cria um outro tipo de
ocupação do espaço que pode remeter quer para ideia de paisagem quer para a
ideia de cenário. Em qualquer dos casos existe uma mais nítida assunção de um
desejo de espectáculo, uma mais declarada vontade de sedução do observador, um
apelo mais forte à instauração de uma ficção emocionada: um “arquipélago vermelho”.
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Alexandre Melo, Arquipélagos, in Expresso, Lisboa, 11/4/1992.
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